Quando a lenda é
mais interessante que a realidade, imprima-se a lenda.
- John Ford
St. Reinold acredita-se ter sido um mártir religioso que viveu por volta de 980 a.C., ele teria sido morto pelas mãos de companheiros de ofício pedreiros[1] e posteriormente viria a ser idolatrado como santo padroeiro deste ofício. Existem várias versões de sua vida e martírio. St. Reinhold poderia ter sido um monge, um cavaleiro, um peregrino ou até mesmo todos os três. Sua história pode ter se originado da vida de várias pessoas diferentes numa confluência de mitos e lendas. Mesmo sua morte pode ter tido várias versões ou motivos.
Numa
primeira versão, Reinold seria um
monge beneditino do mosteiro de São
Pantaleão, em Colônia na Alemanha. A ele foi confiado o dever de
supervisionar as obras de construção que completariam a abadia. Reinold então teria sido assassinado por
outros pedreiros que também trabalham na construção. Eles o espancaram até a
morte com seus malhetes e posteriormente lançaram seu corpo em um fosso ou
afluente do rio Reno[2].
Em
certa narração, Reinold é morto
devido a sua "diligência extrema", que teria provocado à hostilidade
e ressentimento dos companheiros de ofício. Numa outra é narrado que ele teria sido assassinado por
certos companheiros que estariam incomodados por sua força de trabalho e
habilidade superior.
Os
irmãos monges de Reinold foram
incapazes de encontrar seu corpo até que seu paradeiro foi dado conhecimento
por uma revelação velada de uma pobre mulher enferma. Seu corpo então foi
levado de volta para o mosteiro e sepultado com honrarias.
Noutra
versão a narrativa de St. Reinold
teria sido originada a partir da história de Renaud(Reinold em francês),
o filho mais novo de Duque Aymon[3] da
França. Ele supostamente era um descendente de uma irmã de Carlos Magno (e naturalmente membro de sua corte), e o quarto filho
mencionado no poema romântico de William
Caxton, Romance of Foure Sonnes of
Aymon.
Os
quatro filhos do Duque Aymon seriam Renaud, Richard, Alard e Guiscard, e seu primo seria o mago
chamado Maugis. Maugis foi iniciado nos mistérios pela fada Oriande la Fee. Ele havia ganhado um cavalo mágico chamado Bayard, que podia entender a língua
humana e a célebre espada mágica Froberge
quais mais tarde presentearia a Renaud.
A
mais antiga versão existente da história de Renaud
de Montauban e seu primo Maugis, era anônima e escrita em francês
arcaico na forma de uma canção de gesta[4]
chamada Quatre Fils Aymon que data do
final do século XII.
No
conto, Renaud e seus três irmãos eram filhos de Aymon de Dordone. Eles fugiram da corte de Carlos Magno após Renaud ter morto outro dos sobrinhos de Carlos Magno em uma briga durante um
jogo de xadrez, Renaud espanca seu
adversário até a morte com o próprio tabuleiro do jogo[5].
Uma longa guerra segue-se, durante a qual Renaud
e seus irmãos permanecem fieis ao código de cavalaria cristã.
Após
cessarem-se os conflitos, os irmãos são perdoados com a condição de Renaud ir à Terra Santa em cruzada (ou em peregrinação para expiar seus erros)
e Bayard seu cavalo mágico (que podia
expandir seu tamanho e transportar os quatro irmãos de uma só vez, e imediatamente remete ao brasão dos Templários onde 2 cavaleiros compartilham uma única montaria) deveria ser
entregue ao rei.
Carlos
Magno havia dado ordens para que Bayard
fosse afogado no rio Meuse preso a
uma pedra, mas o cavalo acaba fugindo e passando a viver eternamente nas
florestas de Ardennes.
Após
suas aventuras belicosas na Terra Santa,
Renaud volta para França. Em seu
retorno, ele abandona seu lar e entrega-se à religião. Ele então faz o seu
caminho para Colônia na Alemanha e ingressa no mosteiro de São Pantaleão, onde passa a trabalhar
como pedreiro na Igreja de São Pedro[6].
Renaud por fim é assassinado por
ciúmes dos companheiros pedreiros. Seu corpo é milagrosamente salvo do rio e
magicamente refaz o seu caminho para casa para e seus irmãos em uma carruagem.
Na
arte, St. Reinold é comumente
representado com armadura, que refletiria a tradição de que ele havia sido um
soldado antes de entrar na vida monástica. Ele também é mostrado como um monge
beneditino portando um malhete, sendo assassinado por pedreiros ou morto e
sendo lançado na água.
No livro “The Secret History of Freemasonry”
ainda podemos encontrar a seguinte versão para a lenda: Devemos encarar como uma coincidência o fato de que os elementos da
legenda de Hiram também estão presentes no início da canção de gesta "Os
Quatro Filhos de Aymon “? Neste texto vemos Renaud de Montauban, que, depois de
seguir uma vida pouco edificante e desejoso de expiar seus pecados, empenha-se na
construção da catedral de Colônia. Sua força e habilidades incomuns chamavam a
atenção e eram assuntos quais todos os mestres comentavam. Tão logo seus
companheiros de ofício sentiram-se menosprezados e conspiram por uma causa
comum: Eles temiam que Renaud fosse comprometer seus empregos. Eles o atacariam
golpeando-o com malhetes quando este não estivesse vigilante e, em seguida, livrar-se-iam
de seu corpo em um saco qual lançariam ao rio Reno. Na época, eles costumavam
alimentar-se quando "o mestre de obras e os trabalhadores seniores"
deixavam o canteiro de obras para irem a Osteaux (Auvergne), justamente quando
eles puseram seu plano em prática. Entretanto, seu crime não permaneceria em
segredo por muito tempo. Os peixes no Reno, reunidos por um milagre, empurraram
para cima o cadáver, que agora estava iluminado por três velas[7].
Os assassinos completamente aturdidos com a situação não tiveram alternativa a
não ser cumprir penitências.
Conforme acertadamente cita Paul Naudon em “The Secret History of
Freemasonry” o Martírio de St. Reinold e a Assassínio de Hiram Abiff coincidem em diversos pontos em suas
próprias narrativas. Ambos protagonistas estão trabalhando e/ou supervisionando
as obras de construção de um Templo
em terras estrangeiras,[8]
são assassinados por invejosos companheiros de ofício, têm seus cadáveres ocultados
e por fim há uma busca por seus corpos pelos demais companheiros que lhe rendem
as honrarias devidas.
É importante ainda frisar que o
peculiar nome Ayman figura em ambas
as lendas, além de outros detalhes como o golpe fatal ser desferido por malhete
também figurarem. A questão é que os primeiros registros das gestas sobre St. Reinold são anteriores (século XII)
as primeiras menções a Hiram Abiff na
ritualística da maçonaria especulativa (século XVII).
Soma-se
ainda ao fato, que é possível encontrar outros elementos utilizados na
narrativa do Assassínio de Hiram Abiff e
desassociados da mesma em outra Antiga Obrigação denominada de
Manuscrito Graham. Seria o Assassínio
de Hiram Abiff uma lenda inglesa e anglicana recortada da antiga canção de
gesta francesa e católica do Martírio de
St. Reinold tão popular entre os
maçons daquele período?
Qualquer que seja a origem ou
antiguidade de ambos os mitos é inegável que carregam alegorias de caráter
universal pertinente a todo Iniciado.
Numa junção dos mitos, essa Canção sobre Pedra
nos ensina que o trabalho esforçado e hábil pode despertar o mal alheio no
coração dos homens, mas que não devemos ceder a aqueles que se deixam vencer
pelas paixões e vícios. Podemos até sofrer pelas mãos dos perjúrios, mas o nosso
trabalho ascende pela retidão de nossas ações e pelas vozes de nossos bons
irmãos...
Autoria de Tiago Roblêdo M\ M\
Visita Interiora Terrae Rectificando Invenies Occultum Lapidem
REFERÊNCIAS
The Secret History of Freemasonry: Its Origins and Connection
to the Knights Templar
[1]
Na idade média, houve
registros de uma série de catedrais e abadias nas quais pedreiros ou maçons
livres trabalhavam em sua construção, mantendo-se aparte dos trabalhadores
locais que ali também labutavam, ambos os grupos agiam sob as ordens do mesmo
tipo de autoridade eclesiástica.
[2] Em
outro mito adjacente ao Assassínio de
Hiram Abiff na cultura maçônica, Osíris é morto (deixando Hórus seu herdeiro Filho de Viúva assim como era Hiram)
e também tem seu corpo lançado em um rio (Nilo).
[3] Três versões das Antigas
Obrigações (de 1670, 1680, 1690) dão o nome de Aymon ao mestre construtor do Templo de Salomão em pessoa, em
substituição a Hiram Abiff como comumente visto na cultura maçônica.
[4]
As canções de gesta (em
francês “chansons de geste”) são um conjunto de poemas épicos surgidos no raiar
da literatura francesa, entre os séculos XI e XII. Essas canções exerceram
grande influência na literatura medieval, tanto em sua região de origem como
por toda a Europa, e, mesmo com o fim de Idade Média, sua influência continuou
a sentir-se na literatura e até no folclore.
[5]
É possível inferir neste
detalhe até uma suposta alusão ao Pavimento Mosaico que tem desenho análogo ao
tabuleiro de xadrez.
[6]
A localização da
narrativa em uma Igreja de São Pedro
(santo cujo nome original era Simão)
qual nome deriva de “pedra” pode também ser referência ao ofício de maçonaria
ou a construção em pedra qual St. Reinold
era trabalhador e acabaria por torna-se padroeiro. Em Mateus 16:18, Jesus diz: "E eu te declaro: tu és Kepha e sobre esta Kepha edificarei a minha Igreja(...)." Jesus comparava Simão à
pedra, pois Kepha que em aramaico
significa "pedra" foi traduzido para o grego como Petros, através da palavra Petra, que também significa
"pedra".
[7] Tal qual o Livro da Lei nas Lojas Maçônicas.
[8] Hiram Abiff era fenício sendo morto em Jerusalém por companheiros locais assim como St. Reinold era francês e
morto na Alemanha.
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