segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

AS OBRIGAÇÕES ANGLO-NORMANDAS: O primeiro documento da Maçonaria Inglesa


AS OBRIGAÇÕES ANGLO-NORMANDAS

Uma coisa não é justa porque é lei, mas deve ser lei porque é justa.
- Barão de Montesquieu


APRESENTAÇÃO


As origens da Maçonaria inglesas podem ser certificadamente traçadas por volta ao século XIII ou XIV, e provavelmente seu primeiro documento oficial emitido em 1356, qual enuncia Obrigações e narra sobre a formação da Companhia Anglo-Normanda[1] de Maçons de Londres e os princípios que regem a Loja que já existia em York Minster. Cipriano Oliveira em sua obra. Maçonaria, Passado, Presente e Futuro, reforça a relevância desta antiquíssima Obrigação:

“Muitos consideram-no (o primeiro ato fundador da Maçonaria Operativa, mas outros vão muito mais atrás na história. O certo é que, não sendo o mais antigo, é o mais completo e elaborado que se conhece. Informa que[...] 12 pedreiros, liderados por Henry Yevele (1320-1400), foram até a Câmara de Londres, levando um esboço de um Estatuto do Trabalhador da Pedra onde se previa, além da Obediência às autoridades locais, a fidelidade ao Rei e à Religião vigente, um pedido para que suas reuniões fossem fechadas, sem a presença de pessoas estranhas. Obtiveram a solicitada autorização oficial e fizeram um Código e um Regulamento Interno, para a instalação de uma Sociedade de Pedreiros (The Fellowship of Masons). Os seus membros passaram, assim, a ter certos direitos e vantagens, tais como: Trânsito Livre, numa época em que não se tinha a liberdade de viajar; liberdade de reunião naquele tempo proibido, devido ao receio de conspirações e tramas contra os poderes constituídos; e a Isenção de impostos.”


Estas ditas Obrigações Anglo-Normandas são particularmente relevantes a História Maçônica já que presumidamente foram à fonte das Obrigações publicadas originalmente na Constituição de Anderson, que por sua vez, influenciou cada Grande Loja em suas próprias Constituições.


INTRODUÇÃO


Não parece haver razões se para duvidar que o [documento] Nº 1 seja a Obrigação Saxã original, como havia um fluxo constante de maçons franceses na época da conquista[2], uma Obrigação francesa[3] pura deve de ter existido sendo naturalmente acrescentada aos mais antigos documentos ingleses.

O documento de 1356 foi extraído da História da Maçonaria de Gould. Sendo de igual valor a qualquer um que nós possuamos, e ilustra bem o antigo MSS. de uma maneira particular. Em primeiro lugar, as leis são decretadas pelas próprias autoridades que tais Obrigações fazem apelo, e "seis ou quatro Anciões do negócio" são obrigados a testemunhar para que um Mestre assuma um trabalho. Estabelece-se a disputa entre os Maçons Cinzeladores (Mason-Hewers) e Maçons Luzidos ou Assentadores (Light Masons or Setters)[4], e coloca-os ambos sob juramentados Provectos ou Anciões do negócio. É ratificado que não houve cortejo ou ordem para que alguém se tornasse um dos juramentados, e desta forma se constituía a Companhia dos Maçons de Londres, unindo os Maçons e Franco-Maçons[5], dos quais os primeiros possuíam quatro representantes e os últimos possuíam 2, quais agora tornassem iam uma Companhia Unida.

O texto do prefácio do [manuscrito] "Cooke", na medida em que o mesmo seja completo, foi utilizado para este documento, sendo o restante retirado do "Watson MS.", que é um documento completo por si, mas, com muitos erros do copista. O autor cita  "antigos livros de Obrigações" existente antes de seu tempo, e ele possivelmente equivocou-se de "Martellus" para "Secundus"[6] dado que Charles Martel foi regente e não rei, e só “chegou ao [538] reinado por meio de seus descendentes”, Carlos Magno foi seu neto, e possuía um neto chamado Carlos II.


AS OBRIGAÇÕES ANGLO-NORMANDAS


Regulamentos para o negócio dos Maçons, 30 Eduardo III[7], A.D. 1356.

Numa Assembleia entre Prefeito e Vereadores acontecida na seguinte segunda-feira, antes da purificação da Virgem Maria (2 de fevereiro) no trigésimo ano do reinado do rei Eduardo III, etc. Estando presente Simon Fraunceys o Prefeito, John Lovekyn e outros Vereadores, os Magistrados, e John Little, Symon de Benyngtone, William de Holbeche e plebeus, alguns artigos foram ordenados no que tange o negócio dos Maçons, com as subsequentes palavras:

1.                 Considerando que Simon Fraunceys, Prefeito da Cidade de Londres, foi dado a entender que diversas dissensões e disputas foram movidas na referida cidade, entre os Maçons que são "cinzeladores", de um lado, e os Maçons e "assentadores", do outro; isto porque, seus negócios não foram regulamentados de maneira apropriada pelo governo dos Comuns da forma como outros negócios o são. Por isso, o Prefeito proferiu que, para manter a paz de nosso Senhor o Rei, no intuito dissipar tal sorte de dissensões e disputas, e para nutrir o amor entre toda a gente, em honra da referida Cidade, e para o benefício das pessoas comuns. Por concordância e conselho dos Vereadores e Xerifes, determinou a toda à boa gente do referido negócio, ser convocada ante ele, a fim de ter com eles boa e devida ideia como o seu negócio pode ser melhor ordenado e gerido para o benefício das pessoas comuns.

2.                 Diante disso, a boa gente do referido negócio escolhe entre si, doze dos homens mais hábeis de seu ofício, para informar ao Prefeito, Vereadores, e Xerifes, quanto aos atos e obras que tangem tal negócio; Isto é, Walter de Sallynge, Richard de Sallynge, Thomas de Bredone, John de Tyringtone, Thomas de Gloucestre, e Henry de Yevelee, em nome dos "Maçons Cinzeladores"; Richard Joye, Simon de Bartone, John de Estoune, John Wylot, Thomas Hardegray, e Richard de Cornewaylle em nome dos "Maçons Luzidos e Assentadores"; que esta gente seja empossada ante ao referido Prefeito, Vereadores e Xerifes, na forma que segue:

3.                 Em primeiro lugar, que todos os homens do negócio possam operar em qualquer trabalho que tange o negócio, sendo eles perfeitamente qualificados e conhecedores do mesmo.

4.                 Além disso, que a boa gente do referido negócio seja escolhida e empossada quando for necessário, a fim de Supervisionar que ninguém do negócio tome um trabalho para fazer, se este não souber bem e perfeitamente como realizar tal tipo de trabalho, sob a pena de despesas em benefício da comunidade. A primeira vez qual ele seja condenado do mesmo pelas pessoas juramentadas, [indenizará] um marco, a segunda vez, dois marcos e a terceira vez, que ele deve renegar seu negócio para sempre.

5.                 Além disso, que ninguém deva tomar uma carga de trabalho, caso ele não tenha capacidade necessária para concluir tal trabalho; e aquele que pretenda realizar esse tipo de carga de trabalho, deva ter com a boa gente de quem ele tomou tal trabalho para fazer e completar, [543] devendo trazer com ele "Seis" ou "Quatro" Anciões de seu negócio, para tal juramentados, estando eles preparados para testifica-lo para a boa gente da qual tomou tal trabalho para fazer, que ele é forte e capacitado o suficiente para fazer tal tipo de trabalho, e que ele possa permiti-lo concluir esse trabalho da devida maneira, ou então, que este não tenha a capacidade de fazer o mesmo, eles se assim testemunhem, de que ele é forte e capacitado o suficiente para terminar o trabalho, são obrigados a completar tal trabalho, bem e corretamente, em suas próprias taxas, de mesma forma que ele tenha se comprometido no caso do empregador que detenha o trabalho ter tido pago integralmente o trabalhador. E ainda, se o empregador deve nada deixar para pagar às pessoas que tenham empreendido por ele a fim de concluir tal trabalho.

6.                 Além disso, que ninguém deva tomar um Aprendiz ou operário para o trabalho, sem a presença de seu Mestre, e antes que ele tenha sido corretamente informado deste convite; e quem fizer o contrário, e por uma pessoa juramentada for condenado do mesmo, deverá indenizar na primeira vez para a comunidade, meio marco, na segunda vez um marco e na terceira vez 20 shillings; e assim obrigá-lo pagar 20 shillings a cada vez que ele seja condenado do mesmo.

7.                 Além disso, que ninguém do referido negócio seja um Aprendiz por tempo inferior a sete anos, de acordo com o uso da Cidade, e a quem faça o contrário disto, que seja punido da mesma forma.

8.                 Além disso, que os referidos Mestres escolhidos, atentem que todos aqueles quais trabalham por jornada, tomem o seu pagamento de acordo sua qualificação e merecimento do seu trabalho e não desproporcionalmente.

9.                 Além disso, que, ninguém do referido negócio seja diretamente regulado ou dirigido elas pessoas juramentadas de seu negócio, essas pessoas juramentadas deverão dar a conhecer o seu nome ao Prefeito, e do Prefeito o parecer favorável dos Vereadores e Xerifes. Levando-o então, a ser punido com a prisão e outras penas, de modo que outros transgressores possam ter ele como um exemplo, desta maneira, sendo [apropriadamente] geridos pela boa gente de seu negócio.

10.             Além disso, que ninguém do referido negócio seja Aprendiz de outro ocasionando prejuízo ou dano a seu Mestre, até que suas obrigações tenham sido totalmente cumpridas, sob a pena de pagar para o benefício da comunidade, meio marco a cada vez em que ele seja condenado do mesmo.

Autoria de Tiago Roblêdo M\ M\

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REFERÊNCIAS


Maçonaria: Passado, Presente e o Futur,- Cipriano Oliveira
O Ofício do Maçom, Harry Carr


[1] Em 911, o rei da França cedeu a um líder invasor viking, Rollo ou Hrolf, o ducado da Normandia, na esperança de que esses Vikings defendessem o país de novos ataques estrangeiros, fossem Vikings também ou não. Rollo aceitou o tratado e se instalou no território que em alguns anos de conquistas e anexações seria transformado na Normandia. Em 1066, os normandos vencem a Batalha de Hastings, e com isso conquistam o trono inglês. A língua inglesa moderna surgiria da união entre os idiomas dos anglos e saxões com o francês trazido pelos normandos. Em 1154, Henrique II marcou o fim do período normando na Inglaterra. Já no fim do século, nenhum normando ainda se considerava normando, nem mesmo na própria Normandia. Durante a Revolução Francesa, a cultura normanda foi praticamente extinta, mas ainda existem vestígios desta cultura nas Ilhas do Canal.
[2] Conquista normanda da Inglaterra foi a invasão e ocupação do Reino da Inglaterra no século XI por um exército normando, bretão e francês liderado pelo duque Guilherme II da Normandia, mais tarde Guilherme, o Conquistador.
[3] Supões que as técnicas de construções primitivamente empregadas naquelas ilhas (Inglaterra, Escócia, Irlanda etc.) foram importadas do continente e mais especificamente da França durante a Idade Média (a luz veio do Oriente para o Ocidente).
[4] Era comum naquele período a divisão dos construtores (Maçons Operativos) em classes de especialistas, neste caso, Cinzeladores (Hewers) cuidavam dos preparo das pedras-francas e os Assentadores (Setters) cuidavam de erigi-las propriamente nas edificações.
[5] Outra classificação própria daquele período, desta vez se referia a autonomia e proficiência dos construtores. Enquanto o (simples) Maçom era um operário de construção com sede fixa em determinada comunidade, o Franco-Maçom possivelmente recebeu maiores instruções no Ofício em uma Loja oficialmente constituída e possuía a prerrogativa de operar em diferentes comunidades.
[6] As Antigas Obrigações em sua maioria seguem um formato semelhante, no qual é incluído uma “História do Ofício” antes dos estatutos em si, nestas narrativas, Carlos Martel é figura constante.
[7] Eduardo III (Windsor, 13 de novembro de 1312 – Londres, 21 de junho de 1377) foi o Rei da Inglaterra de 1327 até sua morte, ele é lembrado por seus sucessos militares e por restaurar a autoridade real depois do reinado de seu pai, Eduardo II. Eduardo III transformou o Reino da Inglaterra em uma das maiores potências militares da Europa, durante este reinado houve particulares desenvolvimentos na legislação (como no caso da promulgação deste documento) e no governo.

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